CARAS
E MODOS DOS MIGRANTES E IMIGRANTES.
História da Vida Privada no Brasil - vol 2.
Aqui
os autores Luis Felipe de Alencastro e Maria Luiza Renaux visam mostrar o
fenômeno imigratório ocorrido no Brasil Império; detalham cada uma dessas ondas
imigratórias, contando como era o cotidiano dessas pessoas que vinham por opção
ou necessidade para o Brasil; mostra ainda, as atitudes tomadas por parte do
governo para atrair imigrantes específicos com o objetivo de “branquear” a
sociedade e isso é mostrado pelo grande número de imigrantes italianos e alemães
que chegaram ao país nesse período; aqui vale ressaltar que teve uma tentativa
de trazer imigrantes japoneses, mas por conta também do preconceito racial foi
deixado de lado.
É
uma obra prima que detalha a vida privada desses imigrantes de forma completa.
Conta-se os motivos de sua vinda para o Brasil, as dificuldades que encontravam
no caminho e principalmente aqueles que enfrentaram quando aqui chegaram, uma
cultura diferente, pessoas diferentes, clima e idioma diferentes. Mostra também
como esses imigrantes se organizaram em grupos para preservar sua cultura e
enfrentar as dificuldades juntos.
“O
debate governamental sobre raça, a cara e os modos de vida dos imigrantes nasceu
antes mesmo da Independência” (pag.292). Após as Guerras Napoleônicas na Europa
e com a desmobilização dos exércitos, muitos desses soldados queriam começar
uma vida nova num lugar que não os remetesse as lembranças das batalhas, o destino
mais buscado era a América. Nessa época, foram criadas medidas para que
freassem a entrada do imigrante negro e estimulasse apenas a vinda de europeus
brancos (no início a corte também não queriam imigrantes que fossem
protestantes).
Na
parte econômica “a introdução maciça de africanos expandia as fazendas e
reforçava o escravismo. Esse quadro muda por completo a partir de 1850 quando o
contrabando negreiro é definitivamente suprimido” (pag.293) e a partir de então
privilegia-se o estabelecimento de colônias de europeus para trabalharem nessas
fazendas, assim começa uma disputa entre setores governamentais favoráveis a
entrada de europeus e os fazendeiros que não queriam trocar a mão-de-obra do
negro. Nesse momento surge a dúvida entre os fazendeiros, quem então irá chegar
para trabalhar em suas fazendas? Os imigrantes brancos e com posses vinham para
cultivar terras também, e com as medidas impostas pelo governo que privava
negros de desembarcarem no Brasil os fazendeiros encontrava-se sem mão-de-obra.
O
texto aborda dois tipos de imigração, a espontânea e a dirigida, cada uma com
sua particularidade, mas ambos resultados de políticas do Estado. A imigração
dirigida era onde o Estado visava captar um número considerável de trabalho
estrangeiro contando com os mais pobres e submissos; a imigração espontânea era
para focar aqueles imigrantes que já possuíam capital, assim “as verbas
orçamentarias seriam então destinadas à abertura de um cadastro des terras públicas
[...] os imigrantes detentores de capital próprio, aptos a se tornar
proprietários e a desenvolver agricultura moderna comprariam essas terras”
(pag.294).
Com
o fim da escravidão, a proibição da chegada de imigrantes negros e sem opções
para trabalhar no campo “Para os fazendeiros [...] em vez dos negros seriam os
chineses que pegariam na enxada [...] a exemplo do que acontecia em Cuba” (pag.295).
Já os altos funcionários do governo via aí uma oportunidade de “civilizar” o
campo. “Procuraram armar um circuito de transporte de asiáticos e de africanos
livres para substituir os escravos” (pag.296) mas isso não dependia apenas da
vontade do Império, mas também da confiança de outros governos que não
acreditavam na organização autônoma do Brasil para receber esses imigrantes.
Com essa ideia perdurou um longo debate que não chegou a nenhum resultado já
que esse “povo longínquo nem chegou a fincar o pé no Brasil: os chineses”
(pag.296). O desfecho dessa história foi que “O tráfico de chineses para o
Brasil não se estabelecerá por conta do veto cultural e político que faz também
abortar, nesse mesmo ano de 1857, um projeto da Assembleia Legislativa da
província do Rio de Janeiro, visando estimular a vinda “colonos africanos”,
isto é, de imigrantes africanos livres, no Império” (pag.297).
“Ao
tentar instrumentalizar o Estado, após o fim do tráfico, os fazendeiros bateram
de frente com os altos funcionários da Coroa [...] para implementar sua própria
política imigratória, os fazendeiros exigem mais verbas para as províncias”
(pag.299-300). Um fato é que os fazendeiros não lidavam muito bem com os
imigrantes, principalmente nesse primeiro período de onda migratória, 1872.
Ainda sobre esse mesmo período “os africanos livres e escravos (183 mil)
aparecem como o primeiro contingente estrangeiro, seguido pelos portugueses
(121 mil) e pelos alemães (46mil). Por enquanto, convém a fixar a atenção nesse
contingente alemão que, ao lado dos portugueses, vai polarizar o essencial da
política imigrantista até os anos 1880”. (pag.300).
“Choque
cultural e choque social entre fazendeiros e imigrantes provocam, de fato, a
intervenção da força pública em favor dos fazendeiros e protestos dos
consulados em favor dos estrangeiros [...] os trabalhadores alemães, chegados
havia pouco tempo de Hamburgo, rebelaram-se contra os maus tratos [...] num
universo rural cujas formas de revolta consistiam na fuga de escravos, ou no
incêndio do canavial provocado pelo morador que o senhor de engenho expulsara,
surge, de maneira organizada na Fazenda Martin de Sá, um fenômeno tão
extravagante que nem tinha nome [...] a greve de trabalhadores rurais”
(pag.300-301). Os imigrantes que vinham trabalhar nas fazendas não eram
escravos e sabiam que a escravidão estava proibida, eram mais organizados, e
ainda não aceitavam os maus tratos que os escravos sofriam anteriormente, como
resultado disso surgem as greves, no contexto da época. Pelo lado dos
fazendeiros, eles viam esse imigrante como sendo menos produtivo que o escravo
e ainda muito mais exigente, o que claro gerou um descontentamento por parte
dos fazendeiros.
O
autor nos mostra que como consequência da vinda dos imigrantes para cá, os
produtos alimentares de seus países natais também chegam em maior número e
começam a concorrer com produtos brasileiros, não apenas isso, mas também muda
o habito alimentar de muitas cidades “a partir de 1850 acentua-se a penetração
no Império de produtos alimentares europeus, americanos e platinos que
concorrem com a produção mineira. Novos hábitos alimentares são também
introduzidos pelos estrangeiros” (pag.301). Um exemplo de um novo alimento na
mesa do brasileiro foi a carne de carneiro, que até então sofria preconceito
religioso porque esse animal ainda era constantemente relacionado “a carne do
Cordeiro de Deus”. Um outro fator causado pela vinda dos imigrantes e trazendo
junto seus costumes alimentares é o impressionante aumento nos valores da carne
importada nesse período, mostrando que não apenas os imigrantes estavam
consumindo esse produto, mas os brasileiros que aqui já viviam também passaram
a consumi-lo em maior número; ainda, na visão dos imigrantes, a ausência
(exceto em Minas Gerais) da fabricação desses produtos era uma prova do atraso
da vida rural brasileira.
A
influência adquirida nos hábitos alimentares e culturais é propagada pelos
núcleos coloniais e não pelos trabalhadores estrangeiros incorporado nas
fazendas. “Houve, entretanto, um alimento europeu que veio para ficar. De fato,
difundido pelas vagas imigratórias da segunda metade do século XIX, o pão
incorporou-se definitivamente às mesas brasileiras, mudando os hábitos
nutritivos do país” (pag.303). Os portugueses foram os maiores responsáveis por
introduzir o pão a vida cotidiana dos brasileiros com muitos deles abrindo
padarias em solo brasileiro.
Uma
atitude um tanto quanto curiosa tomava conta da vida privada dos negociantes
importadores nesse período de onda imigratória (1845) “Importadores
estrangeiros viviam numa situação delicada que se refletia na vida privada
deles. Sendo apenas agentes consignatários de uma casa matriz europeia, não
tinham propriedade efetiva sobre os bens que importavam e vendiam no Império.
Quando morriam sem testamento, sua loja e as mercadorias ali consignadas podiam
ser embargadas pelos juízes de órfãos e ausentes” (pag.306). “Se o comerciante
estrangeiro tivesse filhos no Brasil, os juízes de órfãos, numa interpretação
nacionalista dos interesses das crianças, incorporavam os bens sob a guarda dos
pais à herança do menor” (pag.306). “Só mais tarde, quando os tratados
internacionais sobre as heranças dos estrangeiros foram completados e
consolidados, mudou o comportamento esquisito dos negociantes estrangeiros com
as mulheres brasileiras” (pag.307). Comerciantes estrangeiros eram prejudicados
por essa atitude do Império de confiscar os bens e os produtos até que seu
descendente/herdeiro se tornasse maior de idade, isso influenciava diretamente
na vida privada dos negociantes e comerciantes estrangeiros na hora de se
relacionar com mulheres brasileiras; muitos deles faziam uma espécie de
“celibato forçado”.
O
autor coloca duas ótimas perguntas para iniciar o tema da imigração portuguesa
“como os moradores da América portuguesa, todos súditos do rei de Portugal,
tornaram-se brasileiros de um dia para o outro após a Independência? [...] como
cada um escolheu sua pátria entre um príncipe regente, proclamado imperador de
um novo país (outubro de 1822), e seu pai, soberano da Metrópole? ” (pag.307).
Ele mesmo, na sequencia nos dá a resposta “No fundo, a escolha foi essencialmente
pautada pelos interesses particulares, pelo modo de inserção da vida privada na
nova vida pública brasileira inaugurada pelo Império” (pag.307).
Após
a Independência, muitos oficiais e tropas lusitanas embarcaram para Europa, mas
mesmo assim, muitos funcionários ainda permaneceram por aqui mesmo enfrentando
a desconfiança as autoridades luso-brasileiras “os fazendeiros e senhores de
engenho [...] os homens livres que viviam em suas terras, eles precisavam
assumir plenamente os direitos políticos outorgados pelo Império, a fim de
garantir sua própria inserção nas novas instituições nacionais” (pag.308) já
aqueles que possuíam comercio, negócios de importações e distribuição de
produtos importados, tomaram uma atitude diferente, eles continuavam submetidos
às casas comerciais do Porto e de Lisboa. Justamente por conta dessa desconfiança
com os portugueses que comerciantes portugueses, donos da maior rede de
distribuição de secos e molhados do Império tornaram-se alvos da hostilidade
nacionalista urbana. “O português aparecendo como o grande estuprador da
ex-Colônia, que ameaçava até a virilidade dos brasileiros” (pag. 309).
Na tentativa do governo de atrair imigrantes
para “civilizar” o campo do país não contava com o grande número de imigrantes
europeus de classes mais baixas que também chegariam aqui por necessidade de
trabalhar e a tentativa de uma vida melhor, esses imigrantes eram enviados para
os campos e tinham um modo de vida muito semelhante aos escravos africanos “A
concentração de imigrantes pobres nas cidades confunde aqueles que contavam com
a imigração branca para “civilizar” o país” (pag.310) esses europeus eram
pobres e exerciam atividades comparada as dos escravos “Nos campos [...] os
imigrantes coabitavam com os escravos nas senzalas e são por vezes controlados
por escravos-feitores. Na cidade, e em particular nas fabricas de charuto, onde
imigrantes menores são empregados ao lado de crianças escravas, as condições de
trabalho são duras” (pag.310-311). Jornais noticiavam o absurdo da “escravidão
branca” que surgia no Brasil, muitos desses jornais eram gerenciados por
compatriotas lusitanos que iam à luta por melhores condições para seus iguais.
“Todos esses incidentes com os imigrantes estrangeiros levam a classe dirigente
brasileira a reelaborar sua própria visão do país” (pag.312).
Era
discutido na época, o quão bem os pobres brasileiros viviam, em muitas
discussões se falava que os brasileiros, mesmo sendo pobres ainda viviam
melhores do que muitas pessoas que habitavam os subúrbios de Londres, por
exemplo, mas a seca que chegou ao nordeste, principalmente ao Ceará, nos anos
de 1877 e 1878 deixou evidente que esse brasileiro não levava uma vida tão boa
quanto os dados do governo colocavam. Essa foi uma das maiores tragédias
sociais e humanas do país, o que acarretou em um período de migração dessas
pessoas para outras partes do país para fugir da seca, fome e pobreza que
enfrentavam ali.
Os
grandes fluxos migratórios são variáveis em relação ao período em que se
analisa, por exemplo “Cerca de 4 milhões de africanos foram deportados para a
Colônia e o Império entre 1550 e 1850, enquanto 5 milhões de europeus,
levantinos e asiáticos entraram no território brasileiro entre 1850 e 1950”
(pag.314). Cada povo teve um momento em que veio em maior número para o Brasil,
todos influenciados por acontecimentos muito específicos, como por exemplo, o
fato da abolição estar consolidada ou os governos provinciais e na sequencia os
estaduais incentivar a vinda de imigrantes específicos, como ocorreu em São
Paulo recebendo cerca de 85 mil imigrantes italianos em 1895. “No Império,
quando se realiza a transição entre o tráfico de africanos e o transporte de
imigrantes livres, o quadro reverte-se de características especificas”
(pag.314). Com a abolição já concluída a imigração é financiada por subvenções
do governo provincial e depois pelo governo estadual.
“Depois
dos anos 1850, outras tentativas de trazer imigrantes chineses, e asiáticos em
geral, foram bloqueadas por razoes culturais” (pag.316) tanto que em 1890 é
publicado um decreto que proíbe a entrada de asiáticos e africanos no Brasil;
mas, sob pressão dos fazendeiros e principalmente dos cafeicultores paulistas
(para quem a imigração era crucial) o governo voltou atrás. O veto foi
derrubado e em 1908 começaram a chegar os primeiros japoneses. “Nessa altura,
já haviam se consolidado no Sul do país as comunidades alemãs e, em menor
medida, as italianas, que iriam construir uma nova face da diversidade cultural
brasileira” (pag.316).
Quando
vamos analisar as colônias alemãs do sul do país o autor nos alerta para
“considerar, em primeiro lugar, a diversidade existente entre os próprios
membros dessas comunidades [...] Tal heterogeneidade, às vezes, levava os
alemães a julgarem a si próprios estrangeiros” (pag.317).
“A
travessia marítima da Europa para o Brasil quando todos se achavam misturados
no navio anonimamente, despertava no imigrante a sensação de isolamento. Nome,
origem, profissão e tudo o mais que até então serviria como identificação
social e motivo de amor-próprio se diluía nessa nova situação que, aliás, já
começava no porto de embarque” (pag.317-318). Esses eram imigrantes que
chegaram a partir de 1824 com um contingente de aproximadamente 350 mil
alemães. “A rota era tortuosa [...] A viagem de navio realizava-se em condições
bastante precárias. A orientação era para que os imigrantes enfrentassem a
travessia do Atlântico reunidos em grupos procedentes da mesma região e do
mesmo estrato social. Disso deveria nascer a consciência de uma condição
idêntica” (pag.318).
“Os
imigrantes dos anos 1830-50 vinham do Sudoeste da Alemanha [...] No período
1850-65, provinham das regiões agrarias do Norte e do Leste. Do restante da
Alemanha saíram, duramente os anos 1865-95, grupos sociais empobrecidos,
juntamente com artesões e pequenos empresários. A partir de 1880, a maioria dos
emigrados passa a ser de procedência urbana” (pag.318) aqui temos que ver que
entre a população agrícola, artesoes rurais, pequenos industriais e domésticos
não havia nenhum sentimento de pátria. “Emigrar surgia como a única alternativa
para um dia se realizar o sonho de ser proprietário de um pedaço de chão”
(pag.318-319).
Quando
aqui chegavam “todos os imigrantes deviam começar a vida na mesma condição – a
de colono [...] Isso não apenas era requisito básico imposto pelo fundador em
concordância com as diretrizes do governo imperial: a situação econômica e
social da maioria dos imigrantes não permitia que se envolvessem no grande
comercio ou na grande agricultura de exportação” (pag.320). Todos viam com o
sonho de trabalho digno e bem remunerado, mas quando aqui chegavam a realidade
com a qual se deparavam era totalmente diferente “a mentalidade com que todos
vieram começar a vida no Brasil era de que ninguém trabalharia para os outros,
para os grandes proprietários, e todos ansiavam pela autonomia econômica”
(pag.321). O texto deixa claro que os imigrantes vindos das áreas rurais da
Alemanha almejavam a liberdade mediante a posse da terra, já aqueles vindo de
áreas urbanas, principalmente os que vieram após 1870 tentavam aqui reconstruir
as condições de uma vida anterior, representada pelas corporações profissionais
das quais tanto se orgulhavam. Vemos também que quando esses imigrantes
chegavam aqui, eram “nivelados” aos olhos do Império, não importava quais eram
suas profissões ou extrato social, ambos recebiam o status de “perturbadores da
ordem”. “Condes, barões, mendigos e vagabundos da Alemanha são nivelados a uma
mesma categoria de perturbadores da ordem comunitária, ordem que se tentava
criar, ou recriar, no Sul do Império” (pag.321).
Os
grupos que chegavam da Europa, geralmente, e formavam uma “comunidade isolada
que se organizava de modo a garantir sua sobrevivência material e cultural
[...] As famílias viviam exclusivamente de sua produção de alimentos, motivo
por que precisavam ter filhos, os quais ajudavam na lavoura. A família
apresentava-se como uma pequena empresa” (pag.322). O modo de vida dessas
famílias era baseado em suas relações de trabalho, a mulher participava
ativamente das corporações de oficio enquanto ainda tinha de repartir o tempo
com as necessidades da casa. Nesse ponto do texto o autor ainda nos mostra como
que as roupas trazidas pelos imigrantes, por serem diferentes, aumentava ainda
mais o isolamento em que viviam; e para tentarem superar esse isolamento
emocional eles recriavam os graus de parentesco ou de “pátria” deixados no
porto antes mesmo de sair da Alemanha, criavam igrejas, escolas e outros
ambientes onde podiam interagir com pessoas da mesma cultura que a sua; e por
fim, esse também era um meio de não deixar de lado sua cultura, seus costumes e
ir passando-os para as próximas gerações. O efeito desse isolamento era ainda
maior nas mulheres “permaneciam isoladas nas colônias – muitas das quais
embarcaram na aventura da imigração para o Império por escolha dos maridos ou
dos pais, e não por vontade própria [...] Fora da cultura aldeã tradicional
europeia, sozinhas num meio ambiente hostil e desconhecido, muitas delas
viveram melancolicamente” (pag.324).
“Havia
entre os imigrantes uma viva consciência da importância do livro e da leitura,
mais ainda entre os luteranos, educados na pratica constante da leitura da Bíblia”
(pag.325) eles possuíam até mesmo grupos de leitura e troca de livros, chamado Lesezirkeln. Em 1852, o governo
brasileiro convidou diversos intelectuais, professores e jornalistas que
tiveram participação na Revolução Liberal de 1848 para virem participar da vida
dessas aldeias. “O modelo de convencia levou ao surgimento, entre os
imigrantes, de uma série de associações, cujo objetivo era a manutenção de seus
costumes” (pag.326).
Comunidades
se uniam pelo que possuíam em comum, a fé “Como a maioria deles era de fé
luterana, forma luteranas as primeiras comunidades religiosas a formar-se nas
colônias do Sul” (pag.326). Sabemos que a religião oficial do Império era o
catolicismo, mas como os ritos e crenças luteranas não representavam uma ameaça
para a hegemonia católica ele foi tolerado, restringindo-se a privacidade da
comunidade. Com a liberdade dada podia-se realizar batizados, casamentos e
serviços fúnebres o que permitia que a vida religiosa e as tradições desses
imigrantes não se extinguissem, mesmo nas partes mais remotas. Com o passar do
tempo foi “solicitado a vinda de um pastor e de um padre e a construção des
respectivos templos” (pag.327) tudo isso para manter viva a cultura desses
imigrantes.
A
vida espiritual desses imigrantes estava também ligada a vida particular. O
autor observa que em Blumenau o principal livro de leitura das escolas naquele
período era a Bíblia. “Todas essas práticas religiosas nas colônias alemãs
levaram o protestantismo a ser fator de preservação da cultura germânica no exterior.
Isso ocorreu primeiramente de forma espontânea e depois deliberadamente, quando
o protestantismo se transformou na religião oficial do Império alemão”
(pag.329).
Aos
olhos dos brasileiros, todas as características presentes na cultura alemã e no
protestantismo trazida por esses imigrantes eram consideradas “estranhas” e
como já dito isso gerou um certo isolamento desses imigrantes. Os brasileiros,
católicos, eram maioria, mas mesmo assim o Império reconheceu o protestantismo
como uma religião o que só serviu para aumentar o atrito entre as culturas. Mesmo
com esses “pequenos conflitos” os setores administrativos ainda eram favoráveis
a imigração alemã. Outro fato importante ressaltado pelo autor sobre a vida
privada dos colonos ao chegarem aqui se instalavam nas determinadas terras e
após isso eram entregues à própria sorte “O interesse por parte do governo
imperial foi grande e suas promessas foram muitas, mas os recursos, escassos”
(pag.331). Para cuidarem dessas terras eles criaram associações para discussão
de problemas relativos ao setor produtivo da comunidade, essas associações
agrícolas se reuniam aos domingos após o culto, outro importante habito na
tradição desses imigrantes.
Sabemos
que catolicismo, naquele período, não exigia que o fiel fosse alfabetizado pois
era o padre quem interpretava e repassava a mensagem contida nas escrituras; já
no protestantismo trazido pelos alemães, exigia-se alfabetização para que os
fiéis conseguissem ler os textos sagrados e realizarem suas próprias
interpretações. Nesse aspecto vemos uma clara valorização da educação e da
figura das escolas, que eram um dos pilares dessas colônias, nelas existiam os
livros didáticos editados para reproduzir os valores específicos como “amor a
nova pátria e fidelidade à velha mãe-pátria”.
Mesmo
possuindo muitas qualidades, ressaltadas principalmente pelo governo imperial,
a chegada de imigrantes alemães teve um fim frutos “da expansão do Império
alemão e da Liga Pangermânica [...] contribuíram para que surgisse no Brasil,
desde o final do século XIX “perigo alemão”, potencialmente reconhecido como
imperialismo ou expansionismo germânico e visto como ameaça à integridade
nacional brasileira” (pag.334).
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